quarta-feira, 31 de maio de 2017

Procura-se um matemático

Procura-se um matemático

É preciso contar em quantas vezes um coração pode ser partido. Talvez para isso, seja necessária a sabedoria de uma cardiologista. De um psicólogo. De uma psiquiatra. De alguém que entenda da divisão do átomo.
Impressiona o quanto corresponde a sensação física com a sensação afetiva. Dói e não tem o que fazer porque na real não é real.

...

Quando eu era adolescente, li na Revista Capricho (talvez) uma citação de Renato Russo que dizia: "Eu não acredito em amor romântico. Eu acredito em respeito e amizade. Amor romântico traz muito sofrimento. E sempre acaba". Acho que copiei na minha agenda. Quem sabe fiquei imaginando quando essa frase faria sentido na minha vida.

Seria agora?
Acho que não.
Tudo o que quero é morrer de amor.
...

Em tempo:  a resposta sobre o coração partido só poderia vir daqui:

domingo, 14 de maio de 2017

Quem era ela?

Ela gostava de Bee Gees e da Lady Di.
Falava um pouquinho de francês e sabia um pouquinho de inglês.
Não perdia uma edição da revista Nova.
Cabelo louro.
Olhos verdes.
Magra, baixinha, ou como diziam na época: mignon.
Bonita, fashion.

Datilografou poesias e textos reflexivos e românticos, que guardou, ordenadamente, em uma pasta catálogo.

Sabia jogar tênis.

Comprou uma televisão a cores em 1980. Ou 1979. O fato é que foi nessa tela que fotografou várias cenas do casamento de Diana e Charles.

Estudou o 2o grau - secretariado, no colégio central da cidade.

Ia ao cinema com as amigas e flertava com o cobrador do ônibus.

Sua mãe faleceu quando ela ainda era só uma mocinha.

Foi morar na cidade. Não sei se ia a Igreja.

Quando criança, tinha cabelos bem longos amarrados com fita, um vestidinho branco, uma bicicleta e uma cachorrinha amada que se chamava Bolinha.

Não é um anjo, nem uma guerreira, nem uma abnegada que padecia no paraíso. Era uma menina, uma jovem, uma mulher.

sexta-feira, 21 de abril de 2017

Sim, amor também acaba

Fera Ferida

Acabei com tudo Escapei com vida Tive as roupas e os sonhos Rasgados na minha saída Mas saí ferido Sufocando meu gemido Fui o alvo perfeito Muitas vezes no peito atingido Animal arisco Domesticado esquece o risco Me deixei enganar E até me levar por você Eu sei quanta tristeza eu tive Mas mesmo assim se vive Morrendo aos poucos por amor Eu sei, o coração perdoa Mas não esquece à toa E eu não me esqueci Não vou mudar Esse caso não tem solução Sou fera ferida No corpo, na alma e no coração Não vou mudar Esse caso não tem solução Sou fera ferida No corpo, na alma e no coração Eu andei demais Não olhei pra trás Era solto em meus passos Bicho livre, sem rumo, sem laços Me senti sozinho Tropeçando em meu caminho À procura de abrigo Uma ajuda, um lugar, um amigo Animal ferido Por instinto decidido Os meus rastros desfiz Tentativa infeliz de esquecer Eu sei que flores existiram Mas que não resistiram A vendavais constantes Eu sei que as cicatrizes falam Mas as palavras calam O que eu não me esqueci Não vou mudar Esse caso não tem solução Sou fera ferida No corpo, na alma e no coração Não vou mudar Esse caso não tem solução Sou fera ferida No corpo, na alma e no coração Sou fera ferida No corpo, na alma e no coração Sou fera ferida No corpo, na alma e no coração

PS: vou pra Porto Alegre, tchau

domingo, 9 de abril de 2017

Música, Pinot noir, o universo e tudo mais

Sabe, tchurururu

E tão feliz
Pensando na vida no universo e tudo mais
Sem golfinhos
Mas com vinho.
E com desejo.
Passo por ruazinhas populares en mi Poa querida
Por linhas estonteanes de Érico Veríssimo
E me acolhe o ronron de uma gata chamada Amy que demorou tanto pra chegar, mas que veio no dia certo.

Será que a vida entra nos eixos, enfim?

quinta-feira, 16 de março de 2017

Passam pássaros e aviões

Sempre o assento na janela, que é para ver Porto Alegre se afastar em poucos segundos.
Gado no pasto - banhado.
Estradas retilíneas.
Montanhas de lixo.
Telhadinhos telhadinhos telhadinhos
Um olho em Proust, quase eterno companheiro de voo, outro no Guaíba rio-lago ao largo.
Passam pássaros e aviões, você passa em casa? 
Tô te esperando.
Quando?
Vamos marcar?
Tem certeza?

Vivendo perigosamente por mais noches locas. E, para finalizar, pensamento mais refinado do que o bom e velho "um amor em cada porto" (ou aeroporto?):

"Qu'importe le flacon pourvu qu'on ait l'ivresse !"
(Augier, apud PROUST, Marcel. A la recherche du temps perdu. Le côté de Guermantes. Paris: Omnibus, 2011, p.1187).

sexta-feira, 10 de março de 2017

A little peculiar

Uns olhos que parecem tristes mesmo quando dizem que estão felizes.
Talvez porque estejam mais lá no fundo
E há sempre uma sombra.

Eu tô bem, juro.

Mas é claro que não e que sim.

Viver dialeticamente é viver perigosamente?

And I say hey yeah yeah I say hey
What's going on?


sábado, 4 de março de 2017

Eu tô ficando velha eu tô ficando louca

No interior que não é meu, conversando sobre a vida, o universo e tudo mais.

Tudo se resolve com risadas de um bebê que descobre o mundo e a pensar como será tornar-se mulher nesse mundo louco, conservador, chato, bonito.

Horas e horas falando ao telefone e dizendo não não vá agora quero honras e promessas lembranças e histórias.

Pássara velha perto demais do ninho. Amanhã é domingo, tchau pro baixo astral porque Porto Alegre está atrás da neblina.

Preservar a certeza de que somos melhores que os outros, que fomos melhor criados que os outros. Deve ser bem louco ter essa certeza, jamais vai colocar em questão se esse é o não o melhor caminho. Tanta segurança assusta. Imagina só que louco nunca ter dúvida. Nunca!

Psicanálise explicaria o papel dos dogmas e do conservadorismo: evita a dispersão das perspectivas e o questionamento. Segurança de que seu caminho e sua decisão estão sempre certos e errados são os outros.

Nossa, imagina que louco nunca ter dúvida?

sábado, 25 de fevereiro de 2017

Thirty-five years honey just one night

Ainda não thirty-five, mas quase.

Professora há 16 anos (sim, é uma direta para você, seu mala, que não gostou da pergunta que te fiz na Mesa-Redonda e se limitou a insinuar que, por ser jovem [risos convulsos], eu não conheço a realidade das escolas).
Voltamos aos parênteses?

Então uma noite ela sentou no meio da sala, as teias de aranha não eram imaginárias, uma taça de algo na mão e todas as suas memórias.
Ricoeur e Koselleck ficaram olhando de longe, presunçosos "você não nos leu o suficiente, não podemos ajudá-la".

Era verdade, ela não podia fazer nada a respeito.

Rüsen começou a racionalizar e tentou classificar as memórias, separando-as por categorias, uma a uma. Como crianças rebeldes, elas trocavam de lugar na fila assim que ele virava as costas. Fizeram tanta algazarra que o pobre senhor desistiu.

Para amenizar a confusão, ela decidiu sair para o pátio escuro. A noite na periferia é bem mais linda, talvez a fumaça chegue às estrelas.

Mas as memórias seguiam plantando bananeira, pulando, correndo, cantando, puxando pela barra da blusa dela, querendo chorar no seu colo, vomitando na sua taça, que ela atirou longe, mas não quebrou. Era de plástico?

Desejo de deitar no pátio sujo, olhos para o céu, o isqueiro competindo com as estrelas. Mas o que os vizinhos iriam dizer? Apesar de tudo, um pouco de bom senso lhe restava.

Halbwachs tentou segui-la, o conselho: essas memórias não eram só dela, mas ao dizer isso ele caiu num buraco. Pollak, que de subterrâneos entende, ficou para ajudá-lo.

Assman sentou ao seu lado, tentou consolar e organizou uma conversa em capítulos precisos com uma progressão didática perfeita que beirou ao enfado. Logo ela, que se orgulha da sua organização didática preciosa (sim, estou ciente das repetições, são intencionais. Não, não fica bom).

Ela a deixou falando sozinha. Bosi tudo observava de longe e tomava anotações.

Se ao menos fosse possível construir uma imagem precisa dessas memórias... Diabinhos a espetar o tempo todo?
Um palimpsesto?
A sensação não é de sobreposição.
A relação com os tempos é orgânica, como tintas que se misturaram ao acaso, mas que nunca originarão uma cor homogênea.
Mas mas mas mas mas mas
Cada toque, cada lugar, um cheiro, o fato de ver aquela casa de um jeito que ela nunca foi, voltar aos lugares com uma vida nova, reencontros, desencontros.
Penúria, ódio, impotência, incompetência,
brilho no olhar daquelas/es estudantes que disseram "você me ensinou algo que presta", daquela que se foi, dos que ela mandou embora, dos que quis por perto e nunca vieram.

Nietzsche, feito um corvo, olhava de longe, do telhado, aquela confusão toda. E ria.

Ela respirou fundo, deu a última tragada, não encontrou solução, foi pra casa.

Não é saudade, nem nostalgia (nostááálrria, como eles dizem lá, sempre achou mais bonito de dizer do que a nostalgía a la brasileña).

Não é querer voltar, não é utopia regressiva, não é apocalipse nau à deriva longe demais do cais do porto, nem perto do caos

Não é ausência nem presença

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2017

Uma das coisas que mais gosto, quando viajo, são aqueles primeiros vinte minutos entre conferir compulsoriamente se deixei tudo desligado e fechado em casa, trancar a porta e entrar no táxi. Então, percorrer a cidade até o aeroporto ou a rodoviária.
A cidade passa pela janela do veículo sob um olhar de despedida e de saudade antecipada. Tchau, Porto Alegre. "Não me esqueça,  amigo. Eu volto".
Os olhos passam pelos cartazes de festas e shows que já foram há semanas, pelos motoristas irritados nos veículos ao lado, troco frases soltas com o motorista:
 - Não te preocupa com o trânsito, eu estou adiantada.
- Pela Castelo ou pela Farrapos?
- Pela Legalidade, por favor.
- Grunf. E a Avenida Getúlio Vargas, essa eles não mudam!
- Grunf.
Horas de sono entrecortado e são as paisagens dos meus Campos Gerais que se estendem logo após a escarpa devoniana.
- Motorista, posso descer no trecho? Logo ali depois do portal, da subida, da curva.
- Se não tiver bagagem...
- Não, só o peso da consciência e dois pés cansados descalzos sueños blancos.
Ponta Grossa, meu interior, dessa vez só  de passagem porque o destino final é Campinas. Da Mui leal e valerosa à Princesa dos Campos e desta à Princesa do Oeste.
Não imaginava voltar tão cedo a Campinas. Esqueci de trazer uma bolsa pequena, como vou fazer? Leva tudo na mão e pega um Uber?
- Driver, follow that car... I mean, motorista, me deixa no Centro de Convenções que eu vou lá rever umas pessoas que marcaram meu interior.
Fechando ciclos, a comemorar com os rituais, do jeito que tem de ser.
Será que é mesmo fato que a cada sete anos a gente muda de casca, feito serpentes?

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2017

Não mais no interior, mas ainda interiorana

Eu não consigo parar de ouvir Sonny Boy Williamson II depois que começo. E vocês?

Essa é uma tentativa de retomar esse blog.

Não sei se faz sentido:

1) não vivo mais no interior
2) não escrevo mais poesia
3) minha memória continua ruim
4) esqueci o que ia escrever no tópico 4

Deu vontade, não sei quantas postagens virão. Confesso que me sinto melhor aqui do que no Facebook, embora o Ibope seja menor...

Não conta pro Lattes. Dizem que é saudável.

Cinco anos se passaram desde a última postagem. Minhas asas tentavam voltar para o centro do meu mundo.

Há quase três anos vivo em Porto Alegre. Mas bah, tchê, para que tão longe? Para quem ama voar, lugar nenhum é longe demais.

Há alguns meses as asas desenroscaram de vez do azul molhado. Dois, talvez três anos tentando desenroscá-las. Na falta de algo melhor, bom... faltou-me coragem para fazer isso mais cedo. Logo eu, que nunca tive medo de nada e sonho com serpentes (ainda). Algumas penas encanecidas. É a vida.

Não é interior, pretendo escrever sobre Mi Poa querida. Desde a primeira sensação ao ver o pôr do sol da minha sala de trabalho, até a última conversa insólita ouvida no elevador, no ponto de ônibus, ou no aeroporto de Guarulhos.

Se tinha mania de usar parênteses a torto e a direito, parece-me que adquiri o costume de começar frases com "mas". Mas vou dar um jeito nisso, mais cedo ou mais tarde.

A foto é vista da janela do meu lugar de trabalho, em 2017. Acervo pessoal.