não sei se é cansaço de estar triste
ou se é cansaço de ter que fazer esforço pra ficar alegre
mas é cansaço
para bloch, o princípio do princípio esperança é a fome
antes havia esperança
agora, fome
pelo menos,
há fome
ainda
Reflexões e observações das cidades de interior em que vivi. Reflexões e observações sobre Mi Poa Querida. Estamos "perto e longe demais das capitais" e ainda não sei se eu gosto ou não gosto disso. 38 anos experimentando, e quem sabe mais alguns por descobrir. Vale também reflexões sobre meu próprio interior, ou outros interiores que observo por aí. Treinamento de olhares e silêncio.
não sei se é cansaço de estar triste
ou se é cansaço de ter que fazer esforço pra ficar alegre
mas é cansaço
para bloch, o princípio do princípio esperança é a fome
antes havia esperança
agora, fome
pelo menos,
há fome
ainda
Lá embaixo, treze andares abaixo, um senhor caminha pela calçada irregular.
Camiseta azul, bermuda cinza e uma sacola plástica na mão direita.
Caminha arcado, lento, instável. Parou diante de um portão, testou a fechadura por alguns instantes. Não funcionou: não era ali a casa dele.
Andou mais um pouco e virou a esquina.
Eu o perco de vista e outras pessoas, mais ágeis, passam pela mesma calçada.
Será que estava perdido?
Por que ele tem que sair de casa nessa pandemia horrenda, e sair sozinho?
E se ele cair na rua?
E se ele não achar mais a sua casa?
um fantasma pela casa
frases sem verbo
pijama ensebado
mas o drink bem-feito na taça
Well done, Caroline
cansaço
cabeça e corpo sem forças
nem desistir nem tentar
que pesada a alma
pesada e opressiva
como o cansaço que sinto
como o verão em Porto Alegre
amanhã já passou
hello darkness my old friend
ao redor, abismo
pra dentro de mim, abismo
lá fora, talvez, um raio de sol
o que dá coragem é a negação do limite?
mais com menos dá mais
menos com menos dá mais
spinoza entendia de matemática?
a essência do ser é fomentar a vida
é só mais um dia, mais um dia
só mais seis capítulos
uma reunião
duas refeições
eu ainda quero o mar
mas só vai ter palmeiras onde canta um sabiá
e uma menininha
um bebê
e um velho
nesse momento, eu deveria estar escrevendo um texto em homenagem ao Joan
eu tenho um prazo
(um prazer um estrago)
leminski tinha razão, parar dá azar.
Joan se foi
eu não quero pensar o que estou pensando
nem quero escrever
necessário silêncio
que nada, solidão
nada adianta, nada
nada muda, nada
E quem sabe ele tá pior, mesmo
distúrbio, desequilíbrio, distração indesejada
sufoco
nem era pra eu estar aqui
e aqui é qualquer lugar
que venha a tristeza hoje
não faz mal
uma solidão alcoólica adolescente de quando em quando
e seguem as curvas da estrada
já disse que não quero nada, mas quero tudo
por mar por terra ou via embratel
but i'm all right i've been lonely before
será que vem o sono?
não há redenção, ela disse
nós mesmos nos colocamos esses pesos nas costas
sísifas voluntárias
competindo para ver quem rola a pedra mais pesada
ano que vem é só um ano, é mais fácil
porra, isso é o básico, não é mais fácil, 2020 é que foi tudo errado
tudo tudo tudo
ou quase tudo
porque tem uma estante nova
tem discos e livros
tem amigas e uma gata
minha sanidade mental
e eu parei de fumar
pinot noir rosé não faz o menor sentido, mas deu pro gasto essa semana
se nada faz sentido há muito o que fazer
não tô cansada de ser forte
afinal, nunca conheci quem tivesse levado porrada
Estou Pessoa ultimamente
quero ler tudo
tudo tudo tudo
não sou vil
talvez as olhos de alguém, paciência
só um pouco de
help me, Fernando
ou não
não quero nada
já disse que não quero nada
vão para o diabo
LISBON REVISITED
(1923)
Não: não quero nada
Já disse que não quero nada.
Não me venham com conclusões!
A única conclusão é morrer.
Não me tragam estéticas!
Não me falem em moral!
Tirem-me daqui a metafísica!
Não me apregoem sistemas completos, não me enfileirem conquistas
Das ciências (das ciências, Deus meu, das ciências!) —
Das ciências, das artes, da civilização moderna!
Que mal fiz eu aos deuses todos?
Se têm a verdade, guardem-na!
Sou um técnico, mas tenho técnica só dentro da técnica.
Fora disso sou doido, com todo o direito a sê-lo.
Com todo o direito a sê-lo, ouviram?
Não me macem, por amor de Deus!
Queriam-me casado, fútil, quotidiano e tributável?
Queriam-me o contrário disto, o contrário de qualquer coisa?
Se eu fosse outra pessoa, fazia-lhes, a todos, a vontade.
Assim, como sou, tenham paciência!
Vão para o diabo sem mim,
Ou deixem-me ir sozinho para o diabo!
Para que havemos de ir juntos?
Não me peguem no braço!
Não gosto que me peguem no braço. Quero ser sozinho.
Já disse que sou sozinho!
Ah, que maçada quererem que eu seja de companhia!
Ó céu azul — o mesmo da minha infância —
Eterna verdade vazia e perfeita!
Ó macio Tejo ancestral e mudo,
Pequena verdade onde o céu se reflecte!
Ó mágoa revisitada, Lisboa de outrora de hoje!
Nada me dais, nada me tirais, nada sois que eu me sinta.
Deixem-me em paz! Não tardo, que eu nunca tardo...
E enquanto tarda o Abismo e o Silêncio quero estar sozinho!
o vento que sustenta a borboleta
e a borboleta com asinhas desajeitadas
ser ambos, na imanência
o fundo do lago, a água, a superfície
o salto, o mergulho, o vôo
feliz aniversário, dona Zeni
lembro de você assim, dias de sol
praia das laranjeiras
caipirinha
eu no mar
nós na estrada
amy na cama
o medo no telhado
mas se juntas já causa imagina juntas
sorrio imaginando como seria te explicar um meme
abrir tua conta no instagram
e trocar zap contigo de manhã
olha, mãe, fiz uma moranga recheada hoje
"filha, mas por que você faz tudo com a mão trocada?"
eu sinto saudades de você, sabia?